Eduardo Martellotta
Um dos
bairros mais tradicionais e antigos de São Paulo, o Brás completou no último dia 8 de junho, 203 anos de muita história.
Nas Atas
da Câmara Municipal já constavam, em 1769, primeiras referências do chacareiro
português José Brás, que deu origem ao nome da localidade. Ele havia erigido
naquela época uma capela dedicada ao Bom Jesus de Matosinhos, na Rua do Brás,
atual Avenida Rangel Pestana.
Mais
tarde a capelinha foi substituída por uma Igreja, em 1803, elevada à categoria
de paróquia aos 8 de junho de 1818, por decreto de El Rei Dom João VI. A capela
era ponto de paragem obrigatória para a Penha de França. Muitas romarias
passavam desde a Sé, utilizando o Caminho do José Brás, até a Penha. Bom Jesus
de Matosinhos tinha muitos devotos, que iam ao local em busca de cura para as
moléstias da época.
O bairro,
que em seu início era uma imensa copa verdejante, com várias chácaras, entre
elas, a Chácara do Ferrão, que pertencera à Marquesa de Santos, e a Chácara do
engenheiro Carlos Bresser, foi dando lugar a fábricas, com a chegada de
imigrantes europeus, a partir de 1890, na Hospedaria dos Imigrantes, situada no
próprio Brás. Eram italianos, espanhóis, portugueses, alemães, sírio-libaneses,
japoneses, entre outros, com o desejo de uma vida melhor no Brasil. Muitos
foram enviados às fazendas do interior de São Paulo para trabalho nas lavouras
de café, outros ficaram na Capital, onde eram operários de poderosas fábricas,
entre elas as Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, fazendo parte o Moinho
Matarazzo e a Tecelagem Mariângela. Grande parte do poderio industrial, tanto
dos proprietários como dos operários, vem da força italiana. Em 1917, o Dr
Jorge Street inaugurou sua fábrica, a Companhia Nacional de Tecidos da Juta, e
uma vila para moradia de seus 2.500 operários, batizando-a de Vila Maria Zélia,
primeira vila operária do Brasil.
Pioneirismo de sírio-libaneses no bairro
Sírio-libaneses
abriram, no começo da década de 1930 na Rua Oriente, lojas de confecção no
atacado, e Nordestinos começaram a vir na década de 1940, desembarcando na
Estação do Norte, atual Estação Brás. O Metrô, introduzido no bairro na segunda
metade da década de 1970, provocou várias desapropriações de imóveis, mas
trouxe progresso ao bairro, incrementando o Turismo de Compras. Coreanos chegam
na década de 1980 e os bolivianos, a partir da década de 1990.
Falar do
Brás, bairro onde trabalhei durante 17 anos como Editor Geral e Repórter do Jornal do
Brás (meu saudoso diretor Milton George Thame costumava dizer que “quem bebe a água do
Brás, jamais sairá dele”), é contar os Pioneirismos do bairro. Sim, o Brás é
pioneiro em pizzarias e cantinas, em times de futebol - aliás, foi no Brás que
surgiu o futebol brasileiro, pelas mãos e pelos pés do brasense Charles Miller,
em 14 de abril de 1895 na Várzea do Carmo, em jornal de bairro - jornal O Braz
do Coronel Albino Soares Bairão, cujo número 1 foi lançado em 1º de setembro de
1895, e em cinemas, que eram muitos - Braz-Polytheama, Oberdan, Roxy, Universo,
Savoy, Piratininga e outros. Além, é claro, do famoso Teatro Colombo, tristemente destruído
por um incêndio em 1966.
O Brás é
pioneiro também em escolas - a Escola Romão Puiggari data de 1898, e a Escola
Profissional Feminina (atual ETEC Carlos de Campos) foi inaugurada em 1911,
oferecendo até hoje o Curso de Modelagem de Vestuário.
Rapaziada do Brás
Bairro
cantado e decantado em verso e prosa por muitos artistas, o Brás agradece muito
ao regente, compositor, instrumentista, professor e radialista Maestro Alberto
Marino, nascido em 23 de março de 1902 no bairro. Ele é o autor da música
Rapaziada do Brás, valsa composta aos quinze anos de idade por ele em 1917, mas
somente gravada em 1927 em solo de violino pelo sexteto “Bertorino Alma”,
anagrama de seu nome.
Em 1960,
seu filho Alberto Marino Júnior compôs a letra para Rapaziada do Brás, gravada
no mesmo ano por Carlos Galhardo. Alberto Marino faleceu em 11 de fevereiro de
1967.
O Brás
também rende tributo a Adoniran Barbosa, que em 1953 compôs o Samba do Arnesto.
O saudoso Ernesto Paulelli, falecido em 2014, foi a inspiração de João Rubinato
(Adoniran Barbosa) para o samba que o Brasil conhece até hoje:
O Arnesto
nos convidô prum samba, ele mora no Brás
Nóis
fumos e não encontremos ninguém
Nóis
vortemos cuma baita duma réiva
Da outra
veiz nóis num vai mais
Nóis não
semos tatu!
Personalidades brasenses
Outros
cantores e escritores brasenses ou que se notabilizaram no Brás foram o saudoso
seresteiro Paraguassú, Alcântara Machado (Brás, Bexiga e Barra Funda),
Isaurinha Garcia, Nelson Gonçalves, poeta Midelandi, Zizi Possi, Germano
Mathias, Lourenço Diaféria e muitos outros. E não podemos nos esquecer também
do Dr. Dráuzio Varella, que contou sua infância no bairro em seu livro Nas Ruas
do Brás. E da Loja Pirani na Av. Celso Garcia, A Gigante do Brás, dos extintos
Clube Silva Teles, o “Vovô da Várzea” e Clube Independência, com seu lindo
tapete vermelho, que ficava acima da Pirani e depois na Rua Dr. Carlos Botelho.
Das Mammas da São Vito e de Nossa Senhora de Casaluce. Das Cantinas Balila,
Castelões e Gigio. Do “Gaetaninho” e do “Beppino”, personagens de Alcântara
Machado. E, por fim, da Escola de Samba Colorado do Brás que tinha Geraldo
Filme e Zé Preto. Oh, Brás bucólico, boêmio, romântico e brejeiro!
São
tantos nomes e lugares que não caberiam nesta matéria! Hoje aos 203 Anos, o
Brás é o maior Polo de Moda da América Latina, e acolhe imigrantes vindos da
Bolívia, Peru, Paraguai, Haiti, Senegal, Nigéria, etc. que trabalham com afinco
nas confecções e no comércio de rua. Está cheio de templos religiosos e
igrejas, denominado também “Bairro da Fé”. Aos brasenses, meus Parabéns, e ao
Brás, com 203 anos de história, Progresso e Vida Longa!